ética

 

A candidatura tardia da búlgara Kristalina Georgieva a Secretário-Geral das Nações Unidas mostrou duas perspectivas (des)interessantes do mundo em que nos movemos.

Por um lado, os jogos de poder e as manobras políticas levadas a cabo para chegar a determinados objectivos; e por outro, a falta de integridade que prolifera por aí, especialmente nas pessoas que deveriam dar o exemplo.

Se esse primeiro detalhe já não nos choca demasiado porque infelizmente faz parte da realidade de todos os dias, o segundo incomoda, porque não se entende como alguém é capaz de entrar para a disputa de um alto cargo mundial no final das provas de selecção, sem passar por nenhuma das fases preparatórias que todos os outros cumpriram. Em português chama-se a isto oportunismo…ou uma boa cunha!

Como pode esta senhora sentir-se confortável nesta situação, quando o cargo em causa defende a união, a ética, a solidariedade e, teoricamente, os bons princípios? Na verdade tudo isto é muito estranho e nada transparente.

Se fosse eticamente correcta, Kristalina Georgieva não teria cedido a pressões fosse de quem fosse, inclusive da chanceler Merkel, a grande impulsionadora da sua candidatura. Recusaria peremptoriamente fazê-lo nesta fase da eleição, por respeito a si própria e a todos os candidatos que seguiram as fases de selecção estabelecidas.

Mas ética… é algo que raramente existe em política!

 

 

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dúvida

 

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Entre o avançar e o retroceder, existe um ponto. De paragem, de dúvida.
Um lugar de reflexão, de ouvir a mente e  o coração.

Avançar, pode significar abertura, o novo, a aventura, o sair da zona de conforto. O enfrentar o medo e superá-lo. Ou não.
Retroceder, é excluir hipóteses, fechar, interiorizar. Fugir ao risco em favor do conforto e da contenção. Guardar o medo.

Ambos são caminhos possíveis e ambos estão certos. E tão difícil pode ser um, como pode ser o outro.

Por isso, deixemos o coração escolher!

 

 

greguerías

 

Ramón Gómez de la Serna é um autor madrileno nascido em 1888, que escreveu em vários estilos, passando pelo romance, crónicas, ensaios, biografias, etc. Chegou a viver algumas temporadas em Portugal, no Estoril, falecendo em 1963 em Buenos Aires. Era um homem que vivia à frente do seu tempo, um vanguardista, mas também um provocador, muito apreciado pelos surrealistas.

Para além dos estilos mencionados, entre 1910 e 1963 escreveu inúmeras frases a que chamou Greguerías, algo que mistura a metáfora com o humor. Porque as aprecio pela acutilância mas também pela sensibilidade e humor, deixo aqui uma pequena selecção, esperando que vos agrade.

 
A lua é o espelhinho com que o sol se entretem de noite a inquietar os olhos da terra.

A harpista toca a música do tear.

À tardinha, passa em voo rápido uma pomba que leva a chave para fechar o dia.

Três andorinhas no fio do telégrafo são o alfinete no decote da tarde.

O que define as mulheres é pensarem que todos os homens são iguais, enquanto que o que perde os homens é crerem que todas as mulheres são diferentes.

A neve apaga-se na água.

O relógio não existe nas horas felizes.

As passas são uvas octógenárias.

O arco-irís é o cahecol do céu.

O pó está cheio de velhos e esquecidos espirros.

Na gruta boceja a montanha.

Vê-se que a água a ferver ficou louca e lhe saltam os olhos.

A cabeça é o aquário das ideias.

A imortalidade do caranguejo consiste em andar para trás, rejuvenescendo até ao passado.

A água solta o cabelo nas cascatas.

O mar é a rotativa mais antiga do mundo que publica incessantemente o jornal A Onda.

O chapéu que voa parece que fugiu com todas as ideias daquele que lhe corre atrás.

No primeiro eléctrico da manhã ainda há sonhos do dia anterior.

A posição mais incómoda para um livro é ficar aberto e de bruços no braço de um sofá.

Há suspiros que ligam a vida à morte.

Quando na árvore só ficou uma folha, parece que ficou com a etiqueta do preço.

O salgueiro toca harpa na água.

O Pensador de Rodin é um jogador de xadrez a quem tiraram a mesa.

Génio: o que vive de nada e não morre.

 
(Todos os dados deste post foram retirados do livro Greguerías, uma selecção, editado em 1998 pela Assírio & Alvim, com escolha e tradução de Jorge Silva Melo).

 

destino

 

Se uma parte do “destino” está nas nossas mãos e nas escolhas e caminhos trilhados enquanto seres conscientes, acredito que haverá uma outra parte relacionada com a nossa evolução enquanto seres espirituais, ligada a energias mais complexas e sempre associada ao princípio da causa-efeito. Ou seja, o que somos e o que nos acontece terá uma razão de ser, teve algures uma causa e tem um sentido para a nossa evolução. Provavelmente porque teremos que aprender algo, seja na forma como encaramos determinada situação, como a resolvemos ou como a superamos. Ou como não conseguimos nada disso.

O video do tema musical que se segue intitula-se Bom destino, pertence ao album Quarto Crescente (2015) e é interpretado pela cantautora Márcia. Ele deu origem a este post não apenas porque gostei do que ouvi, mas especialmente porque me foi enviado por alguém que admiro imenso pela coragem e pela força com que tem enfrentado e superado as tais “prendas” do destino que não dependem das nossas escolhas conscientes. Apesar disso, a essa lutadora associo a alegria, a boa disposição e a positividade. Com certeza que terá momentos de quebra, mas creio que já é suficientemente sábia na forma de lhes dar a volta.

Devolvo-lhe o Bom Destino com estas palavras. Porque acredito profundamente que as pequenas ou grandes vitórias conseguidas perante as adversidades ou situações menos boas que nos estão destinadas (e para as quais não há escolha possível!), talvez sejam as que mais contribuem para que nos tornemos melhores seres humanos e para dar mais um passo na senda evolutiva.

Obrigada Augusta!

 

 

 

outono

ramosa

 
Esgotada
com o calor do Verão,
a natureza pediu ao sol
um tempo de fresquidão.

Sem hesitar,
desviou o sol
o quente olhar,
deixando um lugar
no tempo
para outro poder entrar.

Então,
numa tarde
de Setembro,
vindo nas asas do vento
o fresco Outono
chegou
para ficar até Dezembro.

Veio morno
seguro
e sem pudores,
disposto a acalmar
à natureza os seus calores!

 

(Dulce Delgado, Setembro 2016)

 

apenas luz

 

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Com o Outono
a chegar,
senti na pele e no corpo
os doces raios de sol
de um verão
a terminar.

Que dia tranquilo,
sem vento
nem rugas no seu tempo!

Apenas luz,
azul
límpida e de sintonia,
partilhada numa praia
em plena harmonia.

Estou em paz como o dia.

Não quero que nada me afronte
nem a dor daquele mundo
que fica além do horizonte.

Lamento,
mas só quero este momento!

 

(Dulce Delgado, Setembro 2016)

 

 

beira-mar

 

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A beira-mar oferece um manancial de formas, fragmentos e pormenores com linguagens atraentes. Gosto de os recolher, observar, eventualmente de os desenhar, devolvendo-os depois ao lugar de origem. Eu serei apenas uma paragem no seu percurso.

Pontualmente algumas permanecem mais tempo porque o olhar assim o pede. Ou ficam, para alimentar aquela ancestral faceta recolectora que nos caracteriza e que nos leva a guardar o útil e o inútil, o duradouro e o efêmero.

Em certa medida, essas formas que vivem à beira-mar são breves e transitórias porque estão em contínua transformação. Elas são alvo da erosão provocada pelo mar, mas igualmente pelo ar, sol e vento, elementos de uma natureza que gosto de ver como uma “eterna escultora” que todos os dias trabalha nestas suas obras e as altera… sem tempo e sem objectivo. Apenas porque é assim.

 

superação

 

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Nadar apenas com um braço…
Saltar em altura com uma única perna…
Correr ou nadar sem visualizar a pista…
Jogar voleibol sentado…

 

Ao percepcionar este tipo de imagens nos Jogos Paraolímpicos que estão a terminar, sinto-me estranha. Ou melhor, sinto-me incapacitada de compreender o trabalho, o esforço, a força de vontade, a resistência e a persistência necessária a estes atletas para praticarem certas modalidades, tendo em conta as suas limitações. E ainda chegarem a este evento!

O facilitismo que a nossa integridade física nos concede, deixa-nos a milhas de distância de outras realidades. Nós, que somos os primeiros a ser facilmente invadidos por aquela preguiça que nos impede de ir uma ou duas vezes por semana fazer uma actividade física, apesar de não termos qualquer impedimento nem precisarmos de ajuda para tal. É tudo tão fácil para nós comparativamente com estes atletas!

Olhar para certas imagens dos Jogos Paraolímpicos é uma lição de vida, uma emoção que se instala e que nos faz sentir “pequenos” perante tamanha força de vontade.

Admiro todos os atletas em geral pelo esforço e exigência do seu trabalho, mas admiro profundamente os atletas paraolímpicos pelas dificuldades que enfrentam, pela capacidade de as superar e por persistirem em cumprir os seus sonhos. A seu lado, estarão os treinadores e todos os envolvidos em questões logisticas, num trabalho único de empenhamento que não pode nem deve ser esquecido.

 

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Ele não é perfeito, tem falhas de gestão e certamente erros pontuais associáveis à vertente humana que o sustenta. É uma ideia com sentido, um projecto ainda em execução, mas sempre uma forma de proporcionar saúde a quem nele acredita ou a quem não dispõe de outra a que recorrer.

Promove o mais possível o bem-estar do corpo e, indirectamente, da alma. Pertence a todos o que o querem, mas não deve ser banalizado nem totalmente gratuito, porque o que é gratuito e fácil, deixa de ter valor e passa a indiferente. Deverá ser comparticipado tendo em conta os rendimentos de quem o utiliza.

Foi muito o que mudou nos 37 anos do Serviço Nacional de Saúde, data que hoje se comemora (15 de Setembro de 2016).  Melhoraram as instalações, melhorou a gestão, melhorou a formação técnica e humana, melhorou o acesso. Hoje temos muito mais do que tínhamos antes da sua criação. Quando se persiste num caminho, é possível melhorá-lo cada vez mais. Quando se recua, o objectivo fica desfocado e corre-se o risco de ele deixar de existir.

Como utente desse serviço, recorro a ele sempre que preciso. E não me agarro às pequenas falhas que encontro, mas às boas práticas que o sustentam, sem dúvida bem mais comuns e valorizáveis. Tem possibilidade de crescimento e de evolução, haja boa gestão e vontade política. Mas esse caminho também depende muito de nós e da necessidade de o utilizarmos de uma forma inteligente e educada.

 

a arte da luz

 

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Na Finlândia, o Outono e o Inverno são longos e escuros. Esse facto contribuiu para que o artista Kari Kola, oriundo desse país, desde sempre se sentisse fascinado pela escuridão e pelas possibilidades da luz como contraponto a essa escuridão, dedicando-se a explorar e a modelar essa forma de energia.

Desse trabalho têm nascido ambientes de magia, daquela magia que desde crianças associamos aos contos de fadas, às florestas encantadas ou a mundos misteriosos, e que ele vai espalhando por aí através de instalações artísticas. Este ano foi possível apreciar a sua obra Magical Garden no Parque Marechal Carmona em Cascais, no âmbito da 5ª edição do Festival de Luz Lumina, que aí decorreu entre 8 e 11 de Setembro. Creio que participou neste  festival pela terceira vez.

Pessoalmente aprecio imenso a sua forma de iluminar espaços arborizados, ao criar uma envolvência que sempre me recorda algumas cenas do filme Avatar, de James Cameron, datado de 2009. Mas no jardim de Kari Kola, a ficção transforma-se numa realidade tangível com base na imaginação e na técnica, que permite aos visitantes percorrer calmamente um espaço de fascínio embalados por uma música encantatória, suave e envolvente. Talvez por isso o silêncio e um certo recolhimento tome naturalmente conta do público, como se inconscientemente estivesse a atravessar o interior de uma catedral de Natureza e de Luz. É um momento muito especial.

O Lumina integra em cada edição um leque de obras mais ou menos criativas. Porém, pelas suas características, creio que as instalações que Kari Kola tem mostrado no Parque Marechal Carmona são diferentes e especiais, pela profunda envolvência que permitem.

Do festival deste ano gostava ainda de mencionar a obra Intrude da artista Amanda Parer, constituída por vários coelhos gigantes, insufláveis e luminosos, que invadiram e se instalaram na Baía de Cascais, formando um quadro delicioso.

 

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