
Muitos anos depois voltei à Serra do Açor e à aldeia de Piodão, a chamada aldeia-presépio de Portugal, um lugar diferente, pitoresco e único.
A poucos quilómetros desta vila e já com ela no olhar encontra-se um miradouro dedicado a Miguel Torga, escritor português que escolheu como parte do seu pseudónimo a torga, uma planta resistente, lutadora, de raízes profundas e capaz de se adaptar a lugares inóspitos e difíceis. Como ele, aliás. Na vida real Adolfo Correia da Rocha abraçou a medicina, a outra paixão da sua vida, actividade que exerceu com grande sentido de missão, especialmente junto dos mais desfavorecidos.
Voltando ao tal miradouro, nele se encontra uma pedra gravada com uma frase da sua autoria datada de 1991, ou seja quatro anos antes de falecer e quando já se encontrava doente. Perante o nosso olhar e perante os ventos e a chuvas que arrasam aquelas serranias, este memorial diz…
Com o protesto do corpo doente pelos safanões tormentosos da longa caminhada, vim aqui despedir-me do Portugal primevo. Já o fiz das outras imagens da sua configuração adulta. Faltava-me esta do ovo embrionário.
Faz hoje 25 anos que este médico, escritor, poeta e grande humanista faleceu.
Quem sabe se a sua energia, alma, espírito… o que lhe queiramos chamar, de vez em quando não faz uma pausa neste local-memorial onde escreveu esta espécie de despedida ao Portugal primeiro, ao Portugal simbolicamente nascido nesta aldeia-presépio e, com um etéreo sorriso, ainda sentir a vibração desta paisagem tão especial.
Quem sabe…

(Na terceira linha, onde está escrito “diz” deveria ser “fiz” como consta no texto original. Enganos que não deveriam ter acontecido e muito menos persistido no tempo…)