
Há alguns anos ofereceram-me estes dois livros de poesia de um autor que então desconhecia. Os seus títulos, extremamente belos e sugestivos, logo me encantaram ainda antes da leitura.
Gosto imenso da simplicidade como Carlos Frias de Carvalho descreve o que o sensibiliza ou imagina, mas sobretudo a forma como relaciona todo esse sentir com a natureza e os seus elementos
São vários os livros que este autor tem editados, a maioria com títulos igualmente atraentes como é o caso de No vôo do silêncio, No Umbral da sombra ou ainda Por vezes prende-me um verso.
Partilho hoje alguns poemas deste autor, esperando que os apreciem tanto como eu.
Do livro Espelho de vento, editado pela Arcádia com chancela da Babel (2013)
ave do tempo
pudesse eu ser
num só momento
linha do céu
ave do tempo
aragem
levas apenas
vogais redondas
aromas de ar
tudo tão perto
quase ao alcance
de um breve olhar
fio de aragem
às vezes basta
um fio de aragem
para uma flor
ser a viagem
pelo sítio mais tangível
pelo sítio mais tangível
do meu ser
passaste
e sem pousar
deixaste
a alma a estremecer
o trilho do poema
só no vento
eu invento
talvez o trilho
do poema
que me foge
antes do tempo
E do livro Luz da água, também editado pela Arcádia com chancela da Babel (2010)
cicatriz da água
na penumbra dos teus olhos
há uma cicatriz da água
a flor do musgo
aberta
nas dobras do silêncio
a luz da nascente
só
no canto
eu pressinto
a luz
que brota
da nascente
o mar dos teus olhos
bebi o mar nos teus olhos
sem saber que ali nascia
todo o esplendor
– que em tua boca
eu morria
só por amor
no espelho de água
no espelho
de água
me revia
noite e dia
em cada onda
à luz do dia
na flor
mesmo aberta
se escondia
o amor
que só desperta
à luz do dia
Antes de terminar, gostaria ainda de partilhar alguns dos desenhos de extrema simplicidade incluídos neste ultimo livro. São da autoria do artista plástico José Lourenço e creio que formam uma bela parceria com o “minimalismo” presente nos poemas deste autor.


