experimentações #17

E as experiências continuaram orientadas pelo acaso, seja dos materiais seja dos gestos. Muita coisa foi parar ao lixo porque passava aquele ponto chamado “possibilidade” e virava borrão. Digamos que sabia quando isso acontecia…mas não sabia minimamente o que procurava.

Hoje, ao olhar para a maioria destes desenhos encontro pontos comuns entre eles. Encontro a vontade de “guardar algo” versus a vontade de dar/partilhar… encontro um desejo de exteriorização que se manifesta por vezes de uma forma um tanto explosiva…e encontro sempre um lado mais luminoso que contrasta com outro mais sombrio. Como sempre acontece na vida, aliás.

Ao elaborar este post e com um pouco de imaginação, achei muito engraçado o facto de percepcionar no canto inferior direito do último desenho duas figuras semi-ajoelhadas e com as mãos no chão… à semelhança de dois atletas que esperam o tiro de saída numa qualquer pista de atletismo para uma suposta corrida.

Uma espera que levou trinta e três anos a chegar ao meu olhar!

(Dulce Delgado, aguarela e tinta da China sobre papel, 1988)
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instante

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De instantes se faz o tempo…

Será o instante um fragmento,
um tijolo no muro do tempo…
…ou o cimento que o agrega?

Tudo é instante…

Ele é sopro e respirar
sorriso e olhar
dor
palavra
gesto
pensar…
…e o sim ou o não
que saem sem hesitação!

É o sentir que se foi
o som ouvido silêncio
o pensamento que se desvaneceu
a palavra que calamos
o gesto que recuou
o tempo que ao lado passou
o presente…

…o agora…

 

…já foi!

 

 

(Dulce Delgado, Setembro 2019)

 

 

 

 

a arte do mar

 

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Como um gesto
de mão
e de mar,
as ondas desenham
nuvens
montes
vales
e efémeras paisagens
sem par.

Onda vem…
onda vai…
e outra a abraça no seu recuar!

Cada onda tem um traçar,
desenhos que o meu olhar
aprecia
mas que os corpos,
indiferentes,
pisam sem reparar…

Como é bela a arte do mar!

 

(Dulce Delgado, Agosto 2019)

 

 

 

entre a água… e a música!

 

Um breve movimento
e a vida sai em torrente,
liquida
fresca
e transparente.

Vida
quase ignorada
nesse acto banalizado
de abrir uma torneira,
acção breve
e rotineira
a que apenas damos valor
quando a água aí rareia.

Gesto simples
mas vital
que de nós merecia,
atenção
e gratidão
ao longo do dia-a-dia!

 

Este poema não é recente e surgiu após um corte de água em minha casa, situação sempre incómoda mas muito interessante pela reacção que nos provoca.

Esperava uma ocasião propícia para ser partilhado, momento que surgiu quando há pouco percebi que hoje se comemora em Portugal o Dia Nacional da Água e que se inicia o ano hidrológico, eventos que acontecem num período em que as reservas hídricas do país estão assustadoramente abaixo do desejável. Contudo, a água ainda continua a sair das torneiras… e a cair na nossa indiferença!

Mas este nosso dia nacional é hoje acompanhado por algo maior em dimensão, o Dia Mundial da Música. Esta complexa arte que brota da criatividade de muitos, existe igualmente de uma forma mais simples e minimalista na natureza e nos imensos sons que ela produz e nos oferece, sendo talvez um dos mais agradáveis e tranquilizadores o da água a correr num riacho ou a jorrar de um fontanário.

A água alimenta o corpo…e a sua “música” alimenta a alma…

…por isso, neste dia de água e de música… apreciemos devidamente e com gratidão as “fontes” que estão na sua origem!