Não sei o plano que o Tempo e a Vida me reservam, nem se estarei de acordo com ele… …ou se ele estará de acordo comigo.
Mas se o Tempo e a Vida tiverem um plano para cada um, sendo tantas as pessoas e tantos os planos, certamente que os confundem baralham… …e no final, muitos serão trocados!
O melhor será não planear demais… …nem lhes dar importância a mais!
…a partir de um décimo andar e em dias predominantemente cinzentos e com chuva!
Nas duas ultimas semanas, a casa tornou-se o fulcro dos nossos dias devido ao confinamento. Portugal está num momento muito difícil e ficar em casa é fundamental. Fazendo a fotografia parte dos meus dias, tinha que explorar e aproveitar o mais possível as circunstâncias impostas e o tempo disponível.
Quando olho para o tom monocromático e cinzento das imagens acima, sinto alguma tristeza. A verdade é que a minha personalidade nunca se deu muito bem com dias tão pesados e sem cor. Encontro neles alguma beleza, é verdade mas, decididamente, não são a minha onda, nem o meu mar. E quando são demais, pesam na alma…
Esse cinzento bloco de imagens revela um pouco da paisagem que me envolve. Vivo em Carnaxide, no concelho de Oeiras e a localização do prédio permite-me um olhar vasto, sendo as maiores referências o rio Tejo e a margem sul, a Serra de Monsanto e o chamado Farol da Mama de Carnaxide, uma enorme estrutura que mais parece um foguetão e cuja luz é fulcral para os barcos que atravessam de noite a barra de Lisboa.
Porém, quando um olhar se centra apenas em imagens gerais perde imenso. É essa a primeira tendência quando se vive num andar muito alto e com ampla vista. O meu teria perdido imenso se eu não decidisse limitar o ângulo e orientar a objectiva da máquina para o que estava mais próximo. Aí encontrei curiosos detalhes nunca registados com um olhar puramente fotográfico.
A presença de um hospital na zona dá-lhe algum dinamismo, sendo raro o dia em que o helicóptero do INEM não aparece, transportando doentes ou órgãos para transplante, uma vez que este hospital é uma referência nesse tipo de intervenção. Curiosamente, também uma família de perdizes visita diariamente o relvado que circunda o heliporto do hospital!
Estando o edifício na periferia de uma área industrial e de serviços, nada será construído à sua frente. Além disso, a zona de segurança do heliporto e um baldio anexo permitem-nos ver alguma natureza e respirar fundo com o olhar. Muitos dos que vivem nesta localidade não poderão dizer o mesmo, pois em seu redor apenas existem outros prédios.
O treino diário de um bando de pombos-correios é um momento que gosto muito de apreciar. Como uma alma-grupo eles volteiam e percorrem harmoniosamente o céu. Mas muitos outros animais fazem destes espaços verdes o seu ponto de passagem e de paragem. É o caso dos peneireiros, dos melros, das rolas, dos estorninhos e ainda de um gato muito preto que caça nas imediações do heliporto. Também as gaivotas não poderiam deixar de estar presentes, seja sobrevoando e pousando onde lhes apetece… seja até nidificando, como tem acontecido nos últimos anos no terraço de uma empresa desta zona.
Estamos confinados… eu estou confinada… mas lá em baixo, na rua, a vida continua.
Carros, motas, bicicletas e peões dividem-se entre actividades obrigatórias e de lazer. Cada um terá certamente o seu propósito, como eu neste meu décimo andar, estou a cumprir o propósito de partilhar o que os dias me vão oferecendo.
No momento em que publico este post chove lá fora, está nevoeiro e a vista que tenho é mínima. Se, neste mês de Fevereiro que hoje se inicia o tempo decidir melhorar, talvez ainda faça um outro post dentro desta temática…mas com mais cor.
Até lá….. a solução é viver com saudades da liberdade e de um belo céu azul!
A existência daquele conjunto de árvores passou literalmente ao meu lado até ao dia em que o seu contorno atravessou o meu olhar e fui atraída pela elegante nudez, despojamento e solidão que exprimiam.
No tronco e nos ramos possuem uma grande quantidade de espinhos agressivos e duros, estruturas que estou certa cumprem bem a sua função e que impedem qualquer tentativa de aproximação. Na prática, apenas o olhar as pode tocar.
Há certas pessoas que são um pouco assim. Que têm o dom de atrair olhares por um qualquer aspecto ou detalhe mais físico, mas simultaneamente afastam a vontade de aproximação, seja pela atitude, pelas palavras ou até energia. São pessoas que têm “espinhos” como este Espinheiro-da-Virgínia (Gleditsia triacanthos L.).
Contudo, tal como esta árvore protege no seu âmago os frutos e as sementes, a sua verdadeira essência, também esses seres humanos “guardam” algo potencialmente genuíno, vital, humano e doce.
Indefinida e difícil poderá ser a forma de contornar esses “espinhos” e de chegar ao que é importante.
Um passeio nocturno pela Baixa de Lisboa é um ritual anualmente repetido nesta época festiva.
Gosto de o fazer com o meu companheiro com o espírito de descoberta e sem qualquer compra associada para não desvirtuar os objectivos a que nos propomos: apreciar e registar as iluminações natalícias das principais vias e praças do centro da cidade, e sentir de perto a dinâmica própria da época. Se o primeiro objectivo é sempre gratificante pelo factor surpresa, já o segundo foi um tanto confuso pelo vasto “emolduramento” humano de certas zonas.
Constatei mais uma vez que a dupla “pessoas/ luzes” me leva naturalmente a recuar até à infância e à feira anual que agitava a rotina da cidade onde morava no sul do país. Por um lado pelos muitos visitantes que a procuravam; e por outro, pelo jogos luz/cor que o evento oferecia e que para um olhar infantil de há cinquenta anos tinha uma certa magia.
Mas voltemos ao séc. XXI, a Lisboa e a este passeio sempre algo mágico…
…a chuva entretanto caída espalhou luz, brilho, reflexos…e deixou tudo ainda mais bonito, como revela a primeira imagem obtida no “coração” da cidade, a praça do Terreiro do Paço.
Termino com a fachada de uma das principais ópticas do nosso país, onde constatei que a imaginação e o humor também iluminam a cidade!
Como peões ou como condutores, as faixas de atravessamento são locais a que associamos um maior cuidado e atenção, tendo sempre como base um número bastante restrito de acções: olhar, parar, atravessar e prosseguir.
Nelas se cruzam peões entre si, condutores com condutores e peões com condutores, numa troca mais ou menos silenciosa de energias e de humores. Basta estar um pouco mais atento para nos apercebermos de:
– variados graus de distracção
– olhares de apreciação e de sensualidade
– indiferença
– paciência ou impaciência
– acenos de agradecimento
– olhares e sorrisos que iluminam quem os recebe
– olhares de recriminação ou de condenação
– surpresa
– falta de respeito
– irritação
– cansaço
– pressa
– gestos de provocação
– impropérios mais ou menos desagradáveis
– situações de embaraço
– situações caricatas e que fazem rir
– pedidos de desculpa
– etc.
Tendo isto em conta e ainda que gosto de encarar os pensamentos como formas vivas, animadas, humanizadas, energéticas, moldáveis e mais ou menos coloridas…
…um dia destes, ao olhar com mais atenção para a dinâmica dos poucos metros quadrados de uma passagem de peões, imaginei todos esses humores, pensamentos e energias a “flutuar” e disputando entre si uma entrada em cena:
…que condutor tão cuidadoso! Merece um belo sorriso!
…tens que pedir desculpa!
…aquele condutor está num dia difícil…vai sair asneira!
…vou fazer com que aqueles peões “choquem”… e se olhem nos olhos…
…hum…que visão interessante!…
…vai, vai ter com aquela senhora idosa, ela precisa de ajuda…
…não me apetece parar o carro…vou fazer que não vejo…e passar à frente daquele peão!
…doí-me a perna…não consigo atravessar mais depressa…tenham paciência…
…mais peões? Já chega de paragens por hoje! Quero-me despachar!
…estás com pressa…agora esperas!
…por favor, agradece-lhe com um aceno, não custa nada e é simpático!
…etc, etc.
Sim…eu sei que este é um post sem sentido… nem finalidade… quase absurdo…mas por vezes apetece escrever as coisas absurdas que nos passam pela cabeça!