
Às almas que se vão
em instantes de emoção,
e a todas as memórias
que a par da ternura
serão recordação.
Ao meu pai,
que em paz
e tranquilo,
a Primavera decidiu levar!
Às almas que se vão
em instantes de emoção,
e a todas as memórias
que a par da ternura
serão recordação.
Ao meu pai,
que em paz
e tranquilo,
a Primavera decidiu levar!
As novas gerações não conhecerão este genérico que iniciava diariamente as emissões da Radio Televisão Portuguesa (RTP). Mas estou certa que a maioria dos meus leitores portugueses ainda se lembrarão desta animação.
A sua presença neste post resulta do facto de hoje, dia 7 de Março, fazer precisamente 61 anos que a televisão iniciou em Portugal as suas emissões regulares e, simultaneamente, um projecto de expansão logístico, técnico e de divulgação da sua actividade. A entidade/empresa detentora da Televisão pública integra igualmente a Rádio pública, cujas emissões oficiais foram iniciadas cerca de trinta anos antes.
Possuindo um vasto espólio e muita história, a RTP disponibilizou recentemente online os seus arquivos, proporcionando a todos uma nostálgica viagem pelo tempo.
Organizado por Conteúdos, Colecções e Programas, encontramos neste arquivo uma parte do que foi emitido nestas seis décadas de televisão pública em Portugal. A ideia é apostar no seu crescimento.
Deixo alguns exemplos do vasto acervo disponível:
Cada uma oferece um leque enorme de possibilidades, seja em filmes, fotografias ou textos. A pesquisa, também disponível, permite encontrar algo mais especifico que se pretenda.
Vale a pena explorar as potencialidades deste magnífico arquivo, não apenas pelo seu valor histórico, mas por representar um pouco da vida de todos nós e das nossas memórias. Por isso deve ser saudado, apreciado e explorado com carinho!
O Natal é a época do ano em que a tradição tem mais força. Associada a essa tradição está a memória dos que já partiram…pelos seus hábitos… pelos objectos que nos deixaram e que por vezes são apenas utilizados em épocas mais festivas… pelo legado gastronómico…ou simplesmente pela saudade!
Eu acrescentaria até, que na maioria das mesas da noite ou do dia de Natal, existe uma ou mais “cadeiras invisíveis”, onde se sentam as memórias daqueles que já não podem fisicamente estar ali a partilhar aquele momento.
É sobre essas presenças que fala o escritor Manuel Alegre no poema que passo a transcrever, e cujo título é exactamente Presenças. Porque aprecio a sua obra, tanto em prosa como em poesia, hoje cedo-lhe a palavra.
Eles estão por dentro. Nas
palavras
e nos actos.
Nas cadeiras
nas gavetas
nos cabides e nos fatos.
Quando menos se espera
fogem
dos retratos.
Tem cuidado quando te calças
eles podem esconder-se
nos sapatos.
Na sopa e na maçã
quem sabe se
no vinho.
Vê bem por onde vais
eles gostam das curvas
do caminho.
Na cama onde te deitas
nas camisas
e nas meias
no lençol com que te enxugas
no remédio que tomas para
desentupir as veias
no garfo sobre a mesa
nos copos
e nos pratos
eles estão por dentro e estão por fora.
Podes crer que nunca ficam
nos retratos.
Como viajante no tempo, a memória tem o dom de facilmente nos levar a situações, lugares, pessoas ou emoções que nos marcaram. Essas viagens são as recordações, que podem ser doces, neutras ou amargas. Contudo, à medida que o tempo passa, muitas começam a ser sentidas de forma diferente, transformando-se em ternura. Diria que se “instalam” naturalmente no nosso coração!
Nos últimos dezoito anos, é raro o dia em que não recordo a minha mãe. Por isto, por aquilo…ou por nada! Hoje, o que sinto, é uma imensa ternura, uma doce memória, já sem dor nem tristeza, mas sim com muita gratidão pelo muito que deixou em mim.
O poema que se segue foi escrito pouco depois do seu falecimento, que ocorreu no último dia do mês de Novembro de 1998. Daí, a publicação deste post no dia de hoje. Apesar de datado no tempo e construído de uma forma que não seria a de agora, a mensagem e o sentimento que revela continuam semelhantes… actuais…e sempre dentro de mim!
Mãe
Pouco tempo antes de partires
disseste-me a medo que nada compreendias
porque, apesar da idade
ainda te sentias menina.
Chegou então o dia da grande viagem…
Em liberdade etérea
terás voado entre nuvens e horizontes
e respirado os pormenores da vida
que em vida te foram fugindo.
Terás agora dentro de ti
todas as plantas e flores que apreciavas
montes, vales e amplas paisagens
ou o mar da tua infância que nunca esquecias.
Neste tempo sem limites
e de presença ausente
estarei sempre contigo
Mãe,
porque em mim,
ficou a tua semente!
Existem lugares que ficam connosco. Para sempre. Mesmo que a sua dinâmica se altere com a passagem do tempo, guardamos a emoção sentida, o que nos deram, o que neles deixamos. No fundo, guardamos a sua energia e, estou certa, também esses lugares guardarão num qualquer recanto, um pouco de nós.
Sintra e a sua área envolvente, é um desses lugares de memórias e de emoções. Aí passei vivências únicas na minha juventude, fiz amigos que se mantêm, namorei, casei, vivi, e os meus filhos passaram parte da sua infância.
A Sintra que tenho na memória, não é seguramente a Sintra de hoje, em que prevalece a vertente turística e com ela uma visão bem mais economicista da região.
Retenho uma Sintra ao natural, espontânea, com portões mas sem barreiras. Recordo a naturalidade e a facilidade com que tantas vezes subíamos ao castelo apenas pelo prazer de ver o pôr-do-sol, ou como os verdes e as neblina tinham um cheiro que nos invadia, que era único e que não se esquece; recordo os atalhos e os caminhos não sinalizados que nos chamavam e que sentiamos envoltos numa certa magia; recordo as pequenas plantas selvagens que colhi num muro e que depois de colocadas em terra, se tornaram nos primeiros vasos de uma paixão que hoje persiste; lembro com emoção e quase com um arrepio, os penedos que eram escalados em aventuras mirabolantes pela energia de uma juventude pouco alimentada pela racionalidade, mas bastante permeável à força que a serra transmitia; e lembro ainda uma serra onde se fazia campismo no meio do nada apenas pelo prazer de estar isolado, entre verdes, silêncio e nevoeiro.
Na minha juventude, Sintra foi um modo de estar, uma filosofia e um forma diferente de pensar a vida. Ela foi ainda o som de uma guitarra e o calor de uma lareira em redor da qual a amizade e as grandes conversas eram acompanhadas por chá quente e torradas, ou pelas castanhas, assadas e saboreadas no momento.
Mas Sintra também era a humidade que se sentia nos lençóis ou o cheiro a mofo que as casas detinham. Sintra era o frio e o desconforto, mas igualmente o aconchego e a energia.
Afastei-me da sua área geográfica há mais de vinte anos. Porém, quase todos os dias e sempre que o ângulo o permite, o meu olhar procura o contorno da serra como se fosse um elemento da família. Gosto de a ver límpida, nítida e cheia de luz, mas também tapada pelo nevoeiro ou com um manto de nuvens descansando nos seus montes, como se um nevão a cobrisse de branco.
Continua bonita, com um perfil único e de matizes que variam todos os dias. Persistem os recantos encantadores e é sempre um lugar a que volto. Mas a envolvência humana e agitada que vive na actualidade dificilmente permite senti-la como nos tempos em que era “a nossa serra”. Agora é preciso procurar muito mais para tentar encontrar a calma e a magia que emanava noutros tempos.
Sintra e a sua serra evoluíram…e eu envelheci. Porém, os seus lugares e a sua energia estarão sempre no meu caminho. Até ao fim.